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É A VIDA (O QUE É
QUE SE HÁ-DE FAZER?) LGP BORDA
D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2018 BORDA
D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2019 BORDA
D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2020 |
LGP Eram três
adolescentes. Tinham a particularidade de serem surdos profundos e de
frequentarem uma escola no percurso do autocarro que me levava ao trabalho.
Eles eram os meus companheiros de viagem, todos os dias de semana. De manhã
cedo partilhávamos sempre o transporte e nalguns fins de tarde também. Muitas
vezes eu era o quarto elemento daqueles bancos de duas pessoas, virados
frente a frente, sendo óbvio que ignoravam a minha presença. Apesar de
comunicarem entre eles através de Língua Gestual Portuguesa, faziam mais
barulho do que os restantes (ensonados ou cansados) passageiros. Tinham
conversas animadas e discussões encaroladas, ininteligíveis para quem
assistia. Nunca conseguirei compreender como é possível ter tanta energia às
sete e meia da manhã e continuar na mesma, depois de um dia de escola. Uma manhã tudo
parecia diferente. O trio barulhento estava mais calmo. Cheguei a pensar que
estariam doentes, mas afinal era visível que conspiravam alguma coisa.
Observei-os com atenção e ao fim de algum tempo, resolvi interferir. Comecei
por dizer “olá” com o gesto bem conhecido. Logo de seguida acrescentei: “Sou
tradutor e intérprete de Língua Gestual Portuguesa”. E foi assim
que, inesperadamente, deitei por terra o plano secreto para a subtração
iminente do enunciado de um teste de geometria descritiva, a realizar dali a
dois dias, numa escola secundária do país. O Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa comemora-se a 15 de
novembro. Fontes: Blogue Repórter de
Ocasião, 28 de Setembro de 2025 Borda D’Água do Conto
Curto, Edições Fora da Lei, Ano de 2025 |
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© DANIEL FALCÃO |
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