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O PRIMEIRO CRIME

O CAIR DAS FOLHAS

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NATAL – PAZ NA TERRA

 

BORDA D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2018

BORDA D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2019

BORDA D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2020

 

   

O CAIR DAS FOLHAS

Há coisas inacreditáveis! O Saraiva tinha acabado de passar à reforma compulsiva, por desvio de pequenos valores monetários, quando ganhou uma quantia apreciável num prémio da raspadinha especial. O homem era viúvo há vários anos e não tinha familiares próximos. Resolveu investir nas duas coisas de que mais gostava – viagens e palavras. Palavras? Sim. O senhor Saraiva tinha uma curiosidade patológica pelo significado e pela origem das palavras. No fundo, tinha alma de lexicógrafo (se não sabem o que é, consultem o dicionário).

Durante três meses viajou pelo país. Não importava o destino – uma capital de distrito, uma cidade mais pequena ou até um lugarejo quase desconhecido. Só era indispensável que tivesse uma biblioteca, com um bom acervo de dicionários e enciclopédias. O senhor Saraiva visitou e frequentou tudo o que conseguiu, sempre educado, atencioso e discreto. Depois da sua passagem por esses locais, dos melhores livros consultados sumiam-se as folhas onde constavam as entradas das palavras arroio, alógrafo, calhandro, filáucia, holónimo, parálio, prosélito, sesmarias… e mais algumas que faziam parte da colectânea que o senhor Saraiva se propusera construir.

Essas folhas, arrancadas com precisão cirúrgica, deslizavam tranquilas para os bolsos do casaco do senhor Saraiva. Quem suspeitaria do viúvo tímido e solitário, que partia sempre de mãos vazias?

Afinal, o senhor Saraiva era um genuíno léxico-cleptomaníaco!

 

Fontes:

Blogue Repórter de Ocasião, 21 de Setembro de 2025

Borda D’Água do Conto Curto, Edições Fora da Lei, Ano de 2025

 

© DANIEL FALCÃO