| Publicação: “Flama” Data: 28 de Março de 1958 II Torneio Nacional de Problemística
  Policiária Clube Literatura
  Policial 
 | II
  TORNEIO NACIONAL DE PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA PROBLEMA Nº 6 ELE… O TERROR NEGRO! Autor: M. B. Constantino Não, não
  estou louca. Ele voltou e há-de voltar sempre… sempre… há-de matar-me…
  Acreditai-me… eu conto, mas acreditai-me… –
  Vivemos, eu e o meu marido, na nossa quinta de X, a cinco quilómetros da
  povoação. A casa é isolada, ladeada de laranjais e com um caminho empedrado
  servindo a estrada principal, ao longo da qual se vêem outras vivendas
  isoladas. Não temos criados; os trabalhadores ocasionais vão-se com o pôr do
  sol. J., meu
  marido, vai duas vezes por semana jogar xadrez com H., o vizinho mais
  próximo, a cerca de 1.500 m ao longo da estrada. Foi num desses dias. O
  Inverno começara. Uma chuva miudinha chegou com a noite negra, uma noite sem
  lua… mas meu marido não perde a sua partida; calça as botas altas, põe um
  impermeável e de chapéu caído sobre os olhos, deixa-me entregue aos meus
  afazeres… Virá pela noite e eu esperá-lo-ei como sempre. Dez
  horas, onze… olho através da janela a escuridão lá fora, o pio do mocho…
  sinto um arrepio… volto-me sentindo a presença de alguém. Vou a murmurar: – Já
  voltaste? – Mas fico petrificada. No limiar da porta que se abre
  silenciosamente, uma figura alta, toda de negro, avança… quero gritar… quero
  fugir… o homem de negro avança e a sua mão enluvada de negro vem afagar-me o
  rosto branco; a sua capa lembra as asas de um morcego enorme… um monstro! O
  rosto é apenas uma mancha negra… avança mudamente pela casa e eu sinto-me
  incapaz dum só movimento, os lábios colados de terror… ELE, ele abre um
  armário, tira uma garrafa de Porto, bebe voltando-me as costas, um largo
  trago, e estendendo-me o copo acaba derramando o líquido nos meus lábios e no
  queixo, pousa o copo e a mão negra vem acariciar-me os olhos… silenciosamente
  caminha para a porta: da sua presença ficarão apenas os ténues pingos de
  água, no sobrado, que lhe caíram na capa, a garrafa e o copo sobre a mesa…
  desmaio. J.
  voltou, não me acredita. Limitou-se a sorrir: – «Tu bebeste, querida» –
  Nenhum indício da passagem d’ELE; os pingos secaram, a garrafa e o copo não
  tem impressões digitais. Insisto: – «Eu não bebi… não estou louca… não estou…
  não estou…» … E o
  homem de negro tornou… uma, duas, eu sei lá… sinto que enlouqueço de terror.
  A porta que eu tranco quando J. sai, volto a abri-la receando que ELE deite
  fogo à casa… volto a abri-la para ELE entrar e em silêncio repetir os gestos
  das outras vezes, sem jamais deixar um indício da sua presença… apenas a
  garrafa e o copo inúteis… Fomos ao
  médico. Grito-lhe o meu horror, suplico, choro a verdade… não estou louca…não
  quero estar louca, não… não… O médico encolhe os ombros e receita-me um
  “vin-contre”…   Comprámos,
  a meu rogo, um magnífico e corpulento cão polícia. Sinto que será a minha
  salvação. J. saiu novamente, depois dumas noites de espreita para «descargo
  de consciência». E o terror voltou… a porta abriu-se como sempre, o cão
  rosnou prestes a saltar, mas, acabou por abanar a cauda e deitar-se com o
  focinho entre as patas dianteiras… fora dominado… Meu Deus, dominado…
  dominado… Não
  estou louca! Acreditai-me. Sinto que vou morrer de terror… Aproveito o dia
  para escrever este relato. ELE retornará logo, eu sei! Vi agora D, a loura e
  linda filha do parceiro de J. vir convidá-lo em nome do pai para a costumada
  partida nocturna. Vi J. atirando-lhe, a brincar, um beijo na ponta dos dedos;
  mas que importa? O terror negro deixa-me incapaz de lutar… Oito…
  nove…dez horas! J. saiu com um olhar de comiseração, depois de me esconder
  todas as garrafas. Eu não bebo, meu Deus, eu não bebo… Apago a luz. O vidro
  da janela atulhado de neve, que deixou agora de cair, reflecte a lua
  ternamente… Tapo-a, procurando a segurança da escuridão… Sinto, mais que
  vejo, a porta abrir-se… e o medo avança… avança… a luva negra vem tocar-me o
  rosto… e grito pela primeira vez! Um grito que é um desabafo incontido… Eu
  não estou louca… não estou louca… posso agora provar a presença do terror
  negro! a) –
  Qual o pormenor que pode provar a presença do terror negro? b) –
  Pode dar uma ideia de quem seria ou o que seria o terror negro? | |||||||||||||||||||||||||
| ©
  DANIEL FALCÃO |  | |||||||||||||||||||||||||