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 22 de Março de 1957. É
  publicado, na revista “Flama”, o 1º número da Secção “O Gosto do Mistério…”,
  orientada por Jartur – curiosamente, por lapso
  tipográfico, identificado como “Mr. Dartur”.  Domingos Cabral, com 15 anos completados
  recentemente, responde ao problema naquela inserido – “O Táxi Misterioso”,
  transformando, assim, em “casamento” o “namoro” que à modalidade vinha
  fazendo há algum tempo, através do contacto com a Secção do “Mundo de
  Aventuras”, de que era leitor há alguns anos.  Sabendo, por isso, que era habitual o uso de
  pseudónimo, e perante a dificuldade que sentiu na escolha, rápida, de um,
  acabou, por associação, por perfilhar o “Inspector
  Aranha”. É que, naquele problema, o investigador (Marcos Dias), concebido
  pelo Autor (Jartur), após resolver o caso,
  dirige-se para o “Clube do Aranhiço”. Escolha pouco feliz, de facto, já que
  ninguém inicia a construção de um edifício pelo telhado e o principiante
  começava, nada modestamente, por se designar “Inspector”…
  De qualquer forma, iniciou-se, assim, um longo caminho…  In Mundo dos
  Passatempos, 1 de Setembro de 2007   Correio Policial, 16 de Abril de 2021  | 
  
   
 PRIMÓRDIOS DA PROBLEMÍSTICA
  POLICIÁRIA PORTUGUESA por DOMINGOS CABRAL (do livro com o mesmo título, a
  editar) 31 CICLO REINALDO FERREIRA “REPÓRTER
  X” CONCURSO DOS CONTOS
  MISTERIOSOS Nº 29 A PRINCEZA TRISTE Havia em Teheran, num
  palacete onde os mármores pintalgavam paletes fantásticas, uma princeza triste. Princeza triste, porquê? Porque, de todas as princezas
  da Pérsia, era ela a única que conhecia o mundo. As outras nasciam dentro dos
  harens dos pais, convencidas que o mundo acabava
  onde acabava o horizonte alcançado pelos seus olhos. E passavam do haren do pai – para o haren do
  marido. Eram mulheres cuja alma crescia no ataúde que devia levá-las à
  eternidade. Mas aquela princeza
  triste revoltava-se contra a própria resignação das suas avós. Um dos irmãos
  do pai – perfeito de Zuari - tinha ido a Paris e de Paris trouxera uma
  “troupe” suspeita de amigos (suspeita, frente à critica da aristocracia
  persa). Mas o que perturbava aquela placida
  sonolência da princeza - não fôra
  a presença de homens de um continente desconhecido para ela - de homens que
  lhe representavam um novo planeta: eram os livros, os livros que ensinavam a
  cada ente viver, como planeara a sua vida, desde que não prejudicassem também
  o próximo no seu legítimo direito de viver. E a princeza viu que
  havia felicidades dentro da moral e da convenção, para além de todas as
  prisões a que sujeitavam a sua alma. E a princeza
  triste viu que podia ser ditosa, amando um só homem, para todo o sempre, sem
  trair a sua consciência e sem a ignominia do haren. Impuzeram-lhe esposos – esposos já casados dezenas de vezes, e ela,
  sistematicamente, recusou-os a todos… * * * A princeza triste foi
  amaldiçoada pela família. Encerraram-na numa torre de quarenta metros. A sua
  mocidade germinou-se em lágrimas, solidão e dôr,
  durante mezes, que eram longos como os oceanos que Teheran nunca tinha visto. Na “troupe” de music-hall que o seu tio trouxera
  de Paris, como amostra de civilização, havia apenas três homens: Manuel, herculeo, levantador de pesos inverosímeis; Jean, o
  equilibrista que pedira à lua os segredos da magia - e António, o “homem
  dinamite”, que, expelido de uma caixa de molas, alcançava os trapézios mais
  longínquos da pista do circo. A princeza assistira ao
  espectaculo…  Uma distracção dos
  “eunucos” – os homens de confiança de Zeuck,
  permitira que ela conversasse com os artistas da “troupe”. E a princeza triste recolhera à sua torre, a sua alta torre,
  como um fantasma se dilue na imensidade do espaço… * * * No dia seguinte, a porta do quarto continuava
  fechada - mas a jaula doirada da princeza triste
  estava vazia… A princeza triste tinha sido
  agraciada com azas que Deus oferece aos escravos, para se livrarem do seu
  martírio… Ninguem duvidou… A semente da rebeldia fôra lançada
  por um dos artistas da “troupe”. Qual? Qual deles? * * * Raciocinem! Quem podia alcançar a torre da princeza?  CICLO REINALDO FERREIRA “REPÓRTER X” CONCURSO DOS CONTOS
  MISTERIOSOS Nº 30 A “FRAULEIN” DAS LOIRAS TRANÇAS A noite não encharcara ainda, de negra tinta, a
  paisagem… O arvoredo do visinho bosque, recortava-se, na linha sinuosa das copas, no fundo
  aguado do ceu… Tudo era silencio – no
  campo dos prisioneiros... Os apitos dos chefes da vigilância tinham obrigado
  a fecharem-se as portas dos barracões de madeira. Ao centro erguia-se a
  torre, no topo da qual, um sargento alemão, fixo, como um automato,
  perscrutava, com a agudeza optica dos felinos, a
  sombra que se adensava pouco a pouco. Em redor do campo, entre os parapeitos
  de madeira branca, eriçados de arame farpado – e as valas que isolavam o
  campo, as sentinelas, rítmicas, solenes, iguaes ás próprias espingardas, pisavam a relva, num vai-e-vem de
  pendulo. E nenhuma das sentinelas farejou a curta proximidade dos tres fugitivos… * * * … Quando as portas se fecharam – já os da conjura
  se arrumavam sob os degraus de madeiras, suspensos com chavões de ferro ás paredes das barracas. O espaço existente entre o avesso
  dos degraus e a parede das barracas, onde eles se tinham acolhido, tinha a
  estreiteza de um ataúde. Uma boquilha no seu estojo estaria mais á vontade
  que os três prisioneiros… Dois deles eram portuguezes:
  o tenente Caetano Nóbrega e o capitão-medico Luiz Taveira.  O terceiro era belga: tenente Lucilien Brasseau. O capitão-medico Taveira, homem arrancado a uma
  cómoda clínica de provincia para os azares
  aventurosos da guerra, era quasi obeso, loiro, um tudo nada
  germânico, da fácil conclusão com as gentes alemãs. A timidez que ele trouxera da sua aldeia, agravada com a fealdade do
  seu rosto de estrábico, tinham-lhe valido o apodo de «urso» desde a
  chegada á França. O belga Lucilien,
  quarentão, neurasténico, antigo professor, tinha dois ódios a esguicharem de
  bílis o seu espírito: aos alemães e às mulheres. Puritano e solteiro por convicção, atribuía ás
  filhas de Eva todas as fatalidades da Humanidade, a começar pela própria
  Humanidade… Patriota e latino – viu nos alemães os algozes da pátria, o
  cilindro ameaçador da civilização – e acreditava em todas as lendas ou não de
  ferocidades atribuídas ao inimigo. Dos três o mais novo era o tenente Nóbrega… Moreno, de olhos negros, olhos ibéricos,
  olhos de cigano, a barbicha do cativeiro cuidadosamente pontiaguda a
  dar-lhe o ar romântico de um príncipe
  misterioso – ele fôra o primeiro a conceber
  aquele plano de evasão. E os outros, o obeso Taveira e o carrancudo Lucilien, não hesitaram em correr, ao seu lado, os riscos
  da liberdade… Conseguiram eles alcançar a fronteira holandeza? * * * Súbito, uma nuvem veloz, abafou a lua… A negrura
  que sucedera ás claridades do ceu,
  parecia causada pelo brusco volteio de um contador electrico.
  E os três começaram rastejando pelo solo, em direcção
  á balustrada… Mordendo os lábios, apagando quasi
  a respiração, esperaram que os dois
  sentinelas se defrontassem, no local onde eles se
  sumiam, quasi – e que, reviravolteando, se
  afastassem de novo… Depois, Lucilien cortou, rápido
  com a kruppesca tesoura com que se prevenira, os
  cordões de arame farpado… E de novo, acotovelando a relva, como índios, numa
  emboscada, foram até á vala e deixaram-se escorregar… E afundados na vala,
  ladearam o campo até topar com um acesso, íngreme, quasi,
  a pino, que se abria junto ao bosque… O bosque era a primeira esperança, alcançada pela
  realidade… Só de manhã seria dado o alarme… Tinham, pois, umas oito horas de
  relativo socego… Mas para atingirem a fronteira,
  outra noite havia que viver, nas angustias da
  incerteza e do perigo… * * * Durante uma semana uma emoção, mixto de entusiasmo e de terror, electrizou
  os nervos dos que tinham ficado no campo de concentração. Portuguezes
  e belgas, tinham-se despedido dos três camaradas,
  calando, no fundo d’alma, o pressentimento que a morte os aguardaria, a meio
  da proeza… Era a primeira vez que gente sua intentava a
  evasão. E tanto conheciam a dureza da organisação
  alemã, a severidade da sua espionagem, a presteza com que a soldadesca
  disparava os seus fuzis – que não podiam esperar outra libertação, para os
  que fugiam, do que a suprema – a que liberta o homem para sempre de todas as
  prisões do globo… Tinham assistido ao alarme dado, na manhã
  seguinte, pelos guardas… Tinham ouvido os rugidos de cólera do chefe do
  campo… Tinham visto partir, em todas as direcções,
  os sides levando os soldados na perseguição dos
  três oficiaes. E durante oito dias, redobradas as
  precauções, aos seus ouvidos só chegavam ameaças e blasfemias… Depois, ninguém mais falara da evasão… Dir-se-hia que a tinham arquivado no esquecimento… * * * No décimo primeiro dia, um sargento lusitano,
  antigo aluno de engenharia em Berlim, pôde escutar a conversa de dois oficiaes alemães… Falavam da evasão dos dois portuguezes
  e do belga… Havia, nas palavras do inimigo, mixtos
  de cólera e de admiração… O que aqueles três oficiaes
  haviam feito para alcançar a fronteira!... Verdadeiros prodígios de natação,
  ao atravessarem os rios; prodígios de habilidade,
  para enganarem as populações das aldeias por onde passavam; prodígios de
  destreza acrobática para assaltarem comboios em marcha… Mas apesar de toda essa energia e toda a bravura
  – um deles ficara gravemente ferido, em Baslinder;
  o outro caíra prisioneiro, a poucos quilómetros de Colónia; e dos três só um chegára á Holanda – e em graça a uma mulher… Fazendo-se
  passar por mudo, recolhera-se numa hospedagem, já a pouca distancia
  da fronteira… O hospedeiro tinha uma filha, de longas tranças loiras, como as
  de Kremilde e bela, como mimosa Deusa, se ás deusas fôsse permitido os
  tenros encantos da puberdade. A visinhança
  suspeitára do fugitivo – e este, ao ver que se
  estreitavam os perigos á sua volta, tudo confessara á fraulein
  e, com taes artes e feitiços a encantara que ela se
  prestára a ajudá-lo na passagem da fronteira… E
  quando ambos se encontravam protegidos pelas azas enormes dos moinhos
  Holandeses – ela, a linda alemã que se perdera pelo amor – quizera que dessa perdição lhe viesse a ventura eterna… E
  já não se separaram mais…  * * * Eu conheci os quatro, em Março de 1925, no Hotel
  do Bussaco. O tenente Nóbrega, o capitão Taveira e o belga Lucilien tinham-se associado numa empreza
  industrial. Tinham querido que as suas fortunas corressem juntas, na paz, os
  riscos do negócio, como as suas vidas se tinham arriscado nas aventuras da
  guerra… E junto aos três, uma frágil alemã, ex-fraulein,
  unida para sempre, ao homem que salvara, escutava sorridente, a descrição que
  me faziam das proezas da fuga… – Afinal… quem foi que conseguiu chegar á
  Holanda? E a heroína fräu
  avermelhando mais ainda as pétalas do rosto, disse: –Se os camaradas de meu marido não se ofenderem – dir-lhe-hei
  que entre os três fugitivos só um podia ter perturbado aos meus dezasseis
  anos… E esse é… * * * Quem podia ter apaixonado a linda alemã até ao
  extremo de a levar à libertação do oficial inimigo? Qual dos três podia tê-la
  encantado? * * * Releiam as linhas em itálico... e encontrem as respostas Nota: Na transcricção
  destes dois contos/problemas foi mantida a grafia da época (1927).      
 Fontes: Secção
  Correio Policial, 16 de Abril de 2021 | Domingos Cabral  Blogue Repórter de
  Ocasião, 15 de Março de 2025 | Luís Rodrigues  | 
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   © DANIEL FALCÃO  | 
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