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22 de Março de 1957. É
publicado, na revista “Flama”, o 1º número da Secção “O Gosto do Mistério…”,
orientada por Jartur – curiosamente, por lapso
tipográfico, identificado como “Mr. Dartur”. Domingos Cabral, com 15 anos completados
recentemente, responde ao problema naquela inserido – “O Táxi Misterioso”,
transformando, assim, em “casamento” o “namoro” que à modalidade vinha
fazendo há algum tempo, através do contacto com a Secção do “Mundo de
Aventuras”, de que era leitor há alguns anos. Sabendo, por isso, que era habitual o uso de
pseudónimo, e perante a dificuldade que sentiu na escolha, rápida, de um,
acabou, por associação, por perfilhar o “Inspector
Aranha”. É que, naquele problema, o investigador (Marcos Dias), concebido
pelo Autor (Jartur), após resolver o caso,
dirige-se para o “Clube do Aranhiço”. Escolha pouco feliz, de facto, já que
ninguém inicia a construção de um edifício pelo telhado e o principiante
começava, nada modestamente, por se designar “Inspector”…
De qualquer forma, iniciou-se, assim, um longo caminho… In Mundo dos
Passatempos, 1 de Setembro de 2007 Correio Policial, 16 de Junho de 2021 |
PRIMÓRDIOS DA PROBLEMÍSTICA
POLICIÁRIA PORTUGUESA por DOMINGOS CABRAL (do livro com o mesmo título, a
editar) 44 CICLO REINALDO FERREIRA “REPÓRTER
X” Completámos, na passada semana, a reprodução dos
denominados "Cinquenta Contos Misteriosos", de Reinaldo Ferreira –
"Repórter X" – que o “Janeiro” começou a divulgar em 1 de Fevereiro
de 1927, marcando o início da problemística
policiária em Portugal. Encerramos assim, hoje, o Ciclo Reinaldo
Ferreira, que constitui o primeiro capítulo dos primórdios da história da
modalidade - com a inserção de mais um "Conto Misterioso" do autor…
que afinal escreveu 51 e não 50…, e que, no jornal “O Primeiro de Janeiro”,
antecedeu a publicação destes, como modelo, para melhor compreensão dos
leitores para o que iria seguir-se… * * * Aqui fica, pois, a transcrição do anúncio feito
pelo Jornal na sua 1ª página, seguida do referido conto espécime. “OS CONTOS MISTERIOSOS” “É DIFÍCIL
DECIFRAR OS “CONTOS MISTERIOSOS”? “O JÁ CÉLEBRE
CONCURSO QUE O “PRIMEIRO DE JANEIRO” VAI INICIAR NO PRÓXIMO DIA 1” NÃO É DIFÍCIL! LEIAM o conto
que se segue – “MATARAM O JACOB” “Conto specimen – Conto modelo – Este conto não entra no
concurso.”
“OS 50 CONTOS
MISTERIOSOS” Nº 0 – MATARAM O JACOB Naquela manhã, o bulício aritmico
do manicómio, calara-se, abafado num semi-silencio
de tragédia. Os próprios loucos, convulsionados continuamente pela epilepsia
das suas tragédias – pareciam contagiados pelo pavor mudo que adensava os
ares do Hospital. Havia um louco que tinha sido assassinado! Um guarda, ao abrir, de manhã, a cela 16 –
encontrara um cadáver. A navalha do criminoso escrevera um grosso traço
vermelho no pescoço da víctima. Quem tinha sido? A quem podia interessar a morte
de um pobre alienado, sem fortuna, sem odios?
Vieram detectives da polícia… E todos cruzavam os
braços, como se o mistério daquela morte fosse um dogma! * * * Jacob de Lemos, se chamava o morto. Após uma
mocidade que fôra de tragedia e de miseria – ele conseguira passar à realidade o maior dos
seus sonhos. Desde muito novo que se apaixonara pelo sport. E
de todos os sports havia um que o injectava com as
misteriosas morfinas do paraizo: o box. Jacob nascera “boxeur”, como podia ter nascido
escritor ou musico. Uma atracção especial o levara
aos espectáculos de pugilato, de preferência a
qualquer outro. Quando os professores, atraídos pela sua vocação febril,
tentaram ensinar-lhe a tecnica, pasmaram ante a
destreza e o poderio do neófito. Mas no “box”, como em todas as profissões, não
triunfa quem deve: triunfa o habilidoso, o que dispõe de maior soma de
velhacaria ou de capital para a publicidade. Jacob era pobre – e o seu
talento especialisado não bastava para o erguer ao
quarto doirado da glória e da fortuna. Jacob tivera um amigo dedicado: Leopoldo Ramos. Leopoldo Ramos, rapaz rico, sincero nas suas
paixões, vira-o uma vez. Soube das dificuldades que tinham sido, à volta do
futuro “boxeur”, um arame farpado.
Ofereceu-se para o auxiliar, contando com o seu dinheiro, o caminho
triunfal que lhe pertencia. Alugou-lhe “rings”, fez-lhe cartazes,
subornou-lhe reclamistas. E em dois anos, Jacob, campeão de Portugal, era
vigiado pelos grandes emprezarios estrangeiros. * * * Jacob tinha um rival. Carvalhinho, rapaz da sua
idade, luctador também triunfante, das mesmas dificuldades,
estreara-se no “ring” na mesma época. Só um detalhe os diferenciava: é que
Carvalhinho tinha muito menos “vocação” do que Jacob. Possuidor de uma enorme riqueza muscular,
Carvalhinho estava destinado, aparentemente, à supremacia do boxe em Portugal.
Mas faltava-lhe a inspiração, a virtuosidade da arte, o golpe inesperado, a
esgrima milagrosa do sôco. E em três tentativas – três vezes Carvalhinho fôra vencido por Jacob. * * * Um dia Jacob aceitou o desafio lançado por Bluch, o campeão negro de Cuba. Ao segundo “round”, o
árbitro contou até dez, sem que o negro se levantasse do estrado. E Jacob
fora levado em triunfo. E o vencedor de campeões não contava com uma casca de
tangerina que estava á porta do seu camarim. Escorregou e bateu com a cabeça numa porta de
ferro. Oito dias depois entrava no manicómio. O protector de Jacob,
nas épocas de glória, não o quis abandonar nas horas de desgraça. Levava-o de
automóvel ao manicómio e tomou a responsabilidade do pagamento por um quarto
particular. Um ano depois, o protector,
Leopoldo Ramos, entrou na sala de jantar do seu palacete – visinho ao manicomio, e, como
uma visão vermelha de pesadelo, viu sentado na cabeceira da meza, o seu protegido: o “boxer” Jacob. Atontado com a surpreza,
perguntou: – Que quer isto dizer? Deram-te alta no Hospital? E o louco, de olhos esgaziados,
respondeu: – Não. Fui eu que fugi. Fugi porque tinha umas
contas a liquidar contigo. Fôste tu que puzeste a casca da tangerina à porta do meu camarim. Não
posso ter tranquilidade enquanto não te vir morto a meus pés. Leopoldo compreendeu que a amisade
do “boxeur” transformara-se em odio de loucura. Agil,
conseguiu esquivar-se ao “corp-corp” – e fechou-o
na casa de jantar. Chamou a polícia – e horas depois Jacob reentrava no manicomio… * * * Constou que Jacob melhorava… Que a sua cura era
uma questão de mezes. E o rival, o então já célebre
Carvalhinho, começou a amarelecer: – Se Jacob volta ao “ring”, adeus gloria… * * * Outro ano rolou no abismo do tempo! Leopoldo, o protector
de Jacob, deixara de ser o rapaz alegre de sempre. E uma madrugada,
regressando dum “cabaret” onde tentara distrair-se, ao entrar no patamar de
sua casa, viu dilatar-se da sombra, uma figura sinistra: era Jacob. E, como
no ano anterior, perguntou: – Tu, Jacob? Que quer isto dizer? Deram-te alta? – Não! Fugi… É que eu não posso ser feliz
enquanto pensar que o homem que poz a casca de
tangerina à porta do meu camarim, vive em liberdade. Has-de
morrer às minhas mãos! E o louco esboçou o ataque. Leopoldo conseguiu
saltar para o passeio. Naquele momento passava, lugubre
e sonolenta, uma patrulha da Guarda. E Jacob voltou ao manicomio. * * * No “hall” do manicomio,
um grupo discutia o trágico acontecimento: Carvalhinho, Leopoldo, o crítico Anselmo
– e o agente Romoaldo. E toda a vida de Jacob,
passou, como um “film” cinematografico,
no murmúrio da conversa. E o agente Romoaldo, que
se deixara enervar pelo que ouvia, exclamou: – Não é difícil descobrir o assassino de Jacob… – ? – O assassino de Jacob está neste grupo. Entreolharam-se, pálidos uns, rubros outros,
vexados por aquela acusação cega que caía sobre eles. – Fale claro – exigiu o crítico Anselmo. Quem
julga o senhor que foi o assassino de Jacob? E o agente, sem hesitar, respondeu: –O assassino de Jacob foi… * * * Viram? Já reflectiram
quem podia ser, quem podia ter interesse na morte do boxeur Jacob?
Carvalhinho ou Leopoldo? NOTA: Foi mantida a grafia da época (1927). * * * Amanhã diremos quem foi o assassino de Jacob, e
então todos compreendem que é fácil decifrar. E na realidade, no dia seguinte, lá estava a Solução do Problema Explicativo MATARAM O JACOB! Afinal quem assassinou o «boxeur» enlouquecido? O rival Carvalhinho ou o protector
Leopoldo? Quem foi o assassino de Jacob? * * * Notas finais
relativamente ao Ciclo Reinaldo Ferreira
O ciclo que aqui designámos por (de) Reinaldo
Ferreira que “durante mais de três meses - pondo de parte uma ou outra falha,
quando havia notícias de tomo - o concurso, em regra, teve honras de primeira
página. O conto era acompanhado de um cupão, destinado a ser preenchido pelos
concorrentes, recortado e colado numa caderneta”. Por sua vez, os pequenos enigmas serviram ao
"Repórter X" como mote de várias narrativas que viria a escrever
mais tarde. A partir do conto nº 33, saído em meados de
Março, o "Janeiro" anunciou que já estavam à venda, na
Administração do jornal, as cadernetas em que deviam ser colados os
"coupons", o seu preço de 1$00, e a capa, ilustrada, evocava personagens
dos "contos misteriosos". Findo o certame, o periódico, em 8 de
Abril, tornou pública a sua intenção de repetir os "contos" que,
pelo "engrossamento dos pedidos", mais frequentemente eram
referidos como tendo "escapado à leitura dos concorrentes", e mais
dizia que, brevemente, seria fixado o prazo para a entrega das cadernetas.
Duas semanas depois (22/4), já estava instalado o serviço e recepção e, passado um mês (22/5), o "Janeiro"
punha à venda os jornais com todos os "coupons". O afluxo de cadernetas deve ter excedido as
expectativas porque só em 1 de Outubro é que se procedeu ao sorteio.
Realizou-se às 16 horas, em sessão a que presidiu Artur de Sousa, chefe de
contabilidade da administração do periódico, secretariado pelo jornalista
António Sarmento e pelo concorrente António Augusto Silva. No dia seguinte, o
"Janeiro" fazia descer o pano sobre o sensacional certame,
relatando como decorrera a assembleia e divulgando "a relação dos
números premiados; foram distribuídos 42 prémios para "Cadernetas
simples”, e 6 outros para "Cadernetas duplas”. (Texto reproduzido do livro "O Porto do
"Repórter X", de Joel Lima)
Fontes: Secção
Correio Policial, 16 de Julho de 2021 | Domingos Cabral Blogue Repórter de
Ocasião, 30 de Setembro de 2025 | Luís Rodrigues |
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© DANIEL FALCÃO |
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