Autor Data 24 de Fevereiro de 1983 Secção Mistério... Policiário [389] Competição Torneio
“Dos Reis ao S. Pedro” - 83 Problema nº 4 Publicação Mundo de Aventuras [489] |
A FILHA DO DR. PALHARES Tetraedro A
vivenda erguia-se majestosamente apoiada numa das faces da montanha e parecia
olhar o vale lá em baixo com desprezo. Eu acompanhava o dr.
Palhares que não deixava de praguejar desde que soubera que a sua filha tinha
passado o fim-de-semana com um rapaz, um tal João, na sua própria vivenda de
férias, precisamente aquela de que nos aproximávamos agora. O dr. Palhares estacionou o carro entre um outro carro que
se encontrava ali, o da filha, e uma parede a que estavam encostadas umas
botijas de gás. Quando
nos dirigíamos à porta, esta abriu-se para deixar passar e herdeira da
família Palhares carregando uma maleta. –
Luísa! – gritou o dr.
Palhares. –
Olá, pai – foi a resposta seca. –
Se eu apanho esse João! – exclamou o dr. Palhares ao mesmo tempo que entrava pela casa dentro.
–
De que fala ele? – perguntou-me Luísa enquanto
entrávamos na sala, que se encontrava um tanto ou quanto sombria devido às
janelas se encontrarem com as persianas corridas. –
Parece que o seu pai soube que você e o João estiveram aqui este fim-de-semana.
–
Quem lhe disse isso a ele? –
Ao que parece foi uma amiga sua, a Rita, que se descaiu… –
De qualquer maneira é falso, inspector Fontes. –
É claro que sendo eu um amigo de família, sabia muito bem do que aquela
rapariga era capaz, e não acreditei, nem por um momento, nela. –
Mas olhe, Luísa, o seu pai tem muita razão em suspeitar. Você desapareceu sem
dizer nada e parece que você e o João são namorados, e apesar da vontade do
seu pai… –
É verdade – admitiu ela – e também é verdade que eu desapareci sem dizer
nada, mas foi porque precisava de estar sozinha, e não para estar com alguém.
–
Mas podia ter avisado os seus pais, não? – sugeri ao
mesmo tempo que ouvia os passos do dr. Palhares vindos
do piso superior. –
Quando eu saí não estava ninguém em casa, por isso vim para cá com intenção
de telefonar assim que chegasse; mas desde que eu cá cheguei não tem havido corrente
eléctrica. O que, diga-se, não me incomodou nada.
Até me ajudou a concentrar-me nos meus pensamentos. –
Estou a ver – e depois apontando para o bar – posso servir-me de um uísque? –
À vontade… – esboçou um sorriso. – Deixe-me servi-lo – ajoelhou-se na
alcatifa e retirou uma garrafa do seu lugar, que se encontrava meio cheia. –
Mas, diga-me, espera que o seu pai acredite em si? –
Por que não?… – o sorriso dela tinha-se alargado. – Com
ou sem gelo? –
Com, se faz favor. E o que é que comeu durante o fim-de-semana? – perguntei-lhe enquanto ela me passava o copo, fazendo
tilintar o gelo. –
Trouxe umas embalagens de comida pré-confeccionada,
daquelas que é só aquecer. E felizmente que o nosso fogão a gás funciona
sempre. Sim, porque como só nos servimos da casa durante as férias de Verão,
agora não havia cá nada que se pudesse comer. Mas diga-se em abono da verdade
que eu não vim cá para comer… Eu
estava a divertir-me. Por um lado ela queria que eu acreditasse na sua
história, mas por outro lado queria afirmar-se como mulher e por isso
revelava-me a verdade com subtis insinuações. Nesta
altura o dr. Palhares desceu e juntou-se a nós. –
Não está ninguém em casa, além de nós – disse-nos, enquanto se acercava da janela.
Após um momento de pausa exclamou: – Será que daqui posso ver a moto dele a
descer a encosta? – e puxou as persianas para cima. Mas
a estrada que serpenteava peia montanha abaixo estava vazia. Deslocando-se
graciosamente em direcção à janela, Luísa encostou
a sua testa ao vidro e murmurou: –
Fico sempre maravilhada com esta vista. Vê-se a estrada toda aos esses como
se ela se visse aflita para subir até aqui. –
Mas descer também não deve ser fácil – disse eu e ela olhou para mim com os
olhos a brilhar… –
Bem, vamos embora – decidiu-se o dr. Palhares. Olhei
para Luísa que se mostrava um tanto consternada. Ela olhou-me nos olhos e eu
resolvi ajudá-la. –
Importas-te que eu fique por aqui mais um bocado? Preciso de me descontrair
um pouco e este ambiente é óptimo. –
É contigo – respondeu-me o dr. Palhares. – Então,
eu e a Luísa levamos o meu carro e tu levas depois o dela. Assim
ficou decidido e pouco depois o dr. Palhares e a
filha desciam a encosta, não deixando a última de me agradecer com um leve
sorriso, antes de se sentar ao lado do pai. Quando
o carro desapareceu de vista, chamei pelo João que apareceu do seu
esconderijo, atrás de uma rocha próxima, e aprontámo-nos para descer a
encosta. Seria
Luísa capaz de convencer o pai, sem «meter água», como acontecera comigo?
Conseguiria Luísa um dia casar com aquele rapaz com o consentimento do pai? Por
falar no pai, seria que algum dia o dr. Palhares compreenderia
a filha que tinha? E ela compreendê-lo-ia? A
vivenda já tinha ficado para trás e deslizávamos velozmente pela estrada sob
um fraco Sol de Inverno que começava agora a desaparecer por detrás da
montanha… Desejei
que Luísa se saísse bem daquilo tudo. Sim, porque eu também já tive a idade
dela… Pergunto:
1.
– Será que Luísa «meteu água»? Era óbvia a presença do João? (Explique
convenientemente a razão das suas respostas) |
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© DANIEL FALCÃO |
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