Autor

Autor não identificado

 

Data

Março de 1981

 

Secção

XYZ-Policiário [6]

 

Competição

I Campeonato Nacional de Problemas Policiários

Problema nº 3

Etapa de Almada

 

Publicação

XYZ-Magazine [10]

 

 

NAS TRAMAS DE AFRODITE

Autor não identificado

 

1

– Tu sabes o que esse… esse…

O Drull sorriu-lhe:

– Minha mais querida, fosses branca e estarias vermelha de fúria. Que te fez o humano?

A crista de Vézi estava cada vez mais eriçada, à medida que a sua excitação aumentava. Estava farta. Farta de ser inferiorizada, farta de ser desprezada, farta de ser ignorada. E especialmente farta da pretensa superioridade do humano.

Mas porque tinham eles aquelas estupidices, aqueles disparates inconcebíveis metidos nos seus crânios cabeludos?… Felizmente, nem todos eram como o director do museu.

Pelos sóis de Fragus, ele ia aprender a lição! E seria ela a dar-lha.

2

O Ihart estava a funcionar o melhor possível, guiado pela mão de mestre de um artista completo. Ston era sem dúvida um génio.

Vézi admirou a perícia com que ele dominava o finíssimo raio de luz, expulso do paralelipípedo na sua mão, derretendo o metal e formando a escultura. Tinha de o conseguir imediatamente – aquele bloco de ouro era demasiado caro para ser reposto.

Passou-se muito tempo.

– Está pronto, minha mais brilhante aluna. As mesmas medidas, as mesmas posições. É um trabalho perfeito.

– Sem dúvida que está, mestre – concordou ela. – Podes ficar com o ouro que sobrou, não vou precisar dele. Ainda que seja muito.

E apreciando o que pegava entre as mãos:

– Nunca seria capaz de uma obra deste quilate. Muito e muito obrigada, mestre! – disse e contactou-o. Durante algum tempo, atingiram a totalidade.

3

 «Museu de Artes Humanas e Afrodisíacas, Ciência, Técnica e Amor».

Avaliou ironicamente o edifício e a tabuleta, num olhar de desafio.

Passeou pelo museu e foi ter com o director.

– …nos próximos cinquenta dias. Como sabe, «Perdido» é um grupo escultórico composto por duas peças distintas, em ouro, representando um homem em situação desesperada em cima de um planalto desértico.

– Sim, eu sei. O que mais me admira no trabalho é precisamente a ideia de WittWeel, o contraste entre o admirável trabalho artístico que é a estatueta do homem e a simplicidade e elementaridade do ambiente em que o colocou.

– Esse presunçoso só queria que… Não interessa, ele teve uma boa ideia. De resto, não quero discutir contigo. Aceitas?

– A estatueta não vai desaparecer de lá, nem daqui a um ano. A não ser que já a tenhas roubado. Portanto, em combate! Tu tentas roubar, eu não o permito. Se daqui por cinquenta dias a estatueta ainda estiver lá, terás de reconhecer a tua inferioridade, a da tua espécie em relação à minha. Este testezinho idiota só te convencerá a ti, mas agrada-me. É a primeira vez que entro numa batalha ganha à partida.

4

O trabalho de WittWeel passou a ser guardado numa jaula de Ihart. Uma cortina de raios saía do tecto e rodeava completamente o conjunto escultório, agora na sala principal do museu. O espaço entre os raios era suficientemente pequeno para que a minúscula escultura dourada não pudesse passar por eles sem um alarido capaz de acordar um morto, pelo menos.

Não foram precisas mais medidas de segurança, pois era impossível desligar os raios. Quando entrou sorrateiramente no museu, naquela noite, Vézi sabia-o perfeitamente. Tão perfeitamente como vinte dias antes sabia que seria assim que a obra ficaria reclusa. Tinha apostado bem.

Saiu para a luz das estrelas. O céu de Afrodite estava belo, calmo e sossegado, satisfeito com ela. Tinha a sorte de viver num belo planeta.

5

No interior do museu, o planalto dourado estava completamente deserto.

Vézi entregou no dia seguinte a obra-prima de WittWeel ao director. Nunca lhe disse como a tinha roubado.

Quem diz como foi?

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO