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Autor Autor não identificado Data Fevereiro de 1981 Secção XYZ-Policiário [5] Competição I Campeonato Nacional de Problemas Policiários Problema nº 2 Etapa de Santarém Publicação XYZ-Magazine [9] |
XEQUE-MATE Autor não identificado A nossa história começa numa varanda
de uma linda vivenda onde se encontram o nosso inspector,
de nome Ribeiro e o seu ajudante Mateus a jogar o mais maravilhoso de todos
os jogos: o xadrez. Subitamente, irrompendo o clima de
concentração que ali se achava, toca o mais aborrecido dos aparelhos
domésticos: o telefone. – Está!? Sim… é ele mesmo! O quê?!
Morto?! Sim… vamos imediatamente para aí. – Mateus, temos trabalho. O Fortunato
Gusmão foi assassinado! – Ora bolas! Lá se vai o meu
xeque-mate. Estes tipos nunca mais aprendem a escolher o dia mais propício em
que querem ser assassinados. Logo hoje, num dia tão bonito!… Porque é que não
mor-reu ontem, quando estava a chover a cântaros?! Nem morrer sabem!… – Deixa-te de palermices e
despacha-te! – ordena o inspector Ribeiro, dando
mais uma fumaça no seu exótico cachimbo. Minutos depois já os dois indivíduos
se encontram defronte da enorme e sumptuosa mansão do milionário Fortunato
Gusmão. Não tinham sido os primeiros a chegar lá, pois junto ao jardim que a
mansão possui, já se encontram dezenas de curiosos que se dividiam, ora
perguntando qual teria sido o assassino, ora admirando o luxuoso «Mercedes
Benz» 300 D, que se encontra estacionado junto à garagem. Tentando passar
despercebidos, os dois polícias sobem os trinta e tantos degraus da escada
que os leva à porta da mansão… – Estás a ver, Mateus?! – pergunta o inspector, apontando para os degraus que se encontram
sujos de pegadas de lama. – Talvez sejam as do assassino. Pergunta ao polícia
se ainda ninguém subiu estas escadas depois do crime! Como a porta se encontrava aberta, o inspector aproveitou para ir adiantando trabalho. Encontra-se
numa grande sala, luxuosamente decorada. Dando uma vista de olhos ao local,
Ribeiro não teve dificuldade em verificar que aquela magnífica sala tinha
sido o palco do assassínio do milionário. De facto, facilmente se descobriria
que a vítima se encontrava sentada num sofá, com a cabeça deitada para a sua
frente, pendulante, quase tocando os joelhos.
Defronte situa-se uma pequena mesa com tampo de mármore, onde está colocado
um rico jogo de xadrez, cujas peças, verdadeiros objectos
de arte, nos indicavam que alguém, recentemente, estivera a jogar. – Um bom xeque-mate! – diz para
consigo o inspector Ribeiro, admirando as posições
das peças que o tinham ocasionado. – Bastante bom! Quem me dera saber dar
destes xeques-mates. – De facto assim era. Era um «mate» de um mestre. As «brancas»
com dois bispos e duas torres tinham encurralado o rei «negro», único sobrevivente de cor, no canto superior direito. As
torres encontram-se nos cantos superior esquerdo e inferior direito, estando
os bispos, um no canto superior esquerdo e o outro duas casas à frente na
mesma coluna. – Chefe! O polícia disse-me que foi
ele o único a subir as escadas, além do sobrinho da vítima, de nós e
evidentemente do criminoso… Ele afirmou que quando subiu as escadas as
pegadas já lá se encontravam. – Então as pegadas pertencem ao
criminoso ou ao sobrinho da vítima. – Outra coisa, chefe! O médico legista
já me deu o relatório, embora incompleto, onde nos diz que a vítima morreu
repentinamente com uma bala que lhe perfurou o cérebro, dirigida dos olhos
para a nuca, saindo para o exterior… – Então teremos de procurar a bala.
Procura tu desse lado que eu procuro deste! – ordena o inspector
Ribeiro, enquanto regista os últimos apontamentos sobre o jogo de xadrez. Enquanto Ribeiro procura a bala
assassina, vai registando apontamentos sobre a planta da sala. Assim, se
penetrarmos nela pela porta de entrada, e tomando sempre como ponto de
referência esta porta, nós veremos, mesmo em frente, na parede oposta, uma
janela de cerca de três metros que dá para, uma espaçosa varanda, com mais ou
menos um metro de largura. Do lado esquerdo situa-se um corredor que dá
acesso aos restantes compartimentos da mansão, e do lado oposto fica uma
enorme estante repleta de numerosos livros. Era assim, em traços muito
gerais, a planta da grande sala que tinha sido palco do assassinato de
Fortunato Gusmão. Nesse momento entra na sala, vindo do
corredor, o sobrinho da vítima, Orlando Moura, que segundo ele depois
afirmara, estivera a tomar um duche para se recompor do choque que tivera. – Desculpe esta invasão, mas a porta
estava aberta e aproveitei para ir adiantando trabalho – afirma Ribeiro, que
interrompe a sua inspecção. – De nada. Esteja à sua vontade, por
favor! – responde o sobrinho da vítima que se encontra visivelmente abatido. – Como é que isto aconteceu? –
pergunta o inspector, recostando-se num luxuoso
sofá. – Foi tudo muito rápido, inspector. Estivemos muito divertidos a jogar xadrez, e o
meu tio ficou muito contente em ter vencido, coisa que não acontecia há
muitas partidas. Aí está o jogo. Ainda ninguém lhe mexeu. Para ninguém nos
incomodar, fechámos todas as portas e janelas, de maneira a que as pessoas
pensassem que ninguém aqui se encontrava. Ah, sim! Já me esquecia. Aquela
janela, que dá para as traseiras, foi o único acesso à casa que ficou aberto,
para que entrasse algum ar fresco, pois está um calor sufocante. Depois do
jogo fui até ao meu quarto buscar um livro de xadrez para o mostrar ao meu
tio, pois era um livro recente e ele ainda não o conhecia. Foi então que
aconteceu o terrível!… Estava eu no meu quarto quando ouvi um tiro, seguido,
quase simultaneamente, de um agudo grito. Vim imediatamente ver o que tinha
acontecido, e qual não foi o meu espanto, ao ver o meu tio naquele estado…
Fui imediatamente àquela janela que dá para a varanda, pois era a única via à
casa que se encontrava aberta, e ainda pude descortinar um vulto correndo
pelo campo de areia, rumo à estrada, onde tomou um carro, previamente lá
estacionado. Ainda se podem ver as pegadas deixadas pelo assassino no extenso
areal das traseiras… – Quem é que pensa ser o autor disto
tudo? – pergunta Ribeiro enquanto se dirige para a varanda que dá para as
traseiras, com o fim de poder ver as tais pegadas. – Não faço a mínima ideia, inspector. Ele não tinha inimigos. Tinha bastantes
pessoas que lhe deviam muito, mais daí a matá-lo! Duvido muito… – Chefe! Encontrei a bala assassina!…
– interrompeu Mateus, apontando para o local onde ela se encontra. Depois de
ter atravessado o cérebro de Fortunato Gusmão, a bala cravou-se na parede, a
cerca de um metro e meio do solo, situada ao lado esquerdo da janela que dá
acesso à varanda, para quem se situasse junto à porta de entrada. – Muito bem! Os rapazes da balística
já têm trabalho. Agora nós vamos às traseiras verificar as pegadas e se
possível tirar o molde – ordena o inspector, dando
uma palmadinha de parabéns nas costas de Mateus. Minutos depois já os três indivíduos
se encontram no campo situado nas traseiras da mansão. Devido à chuva que
tinha caído no dia anterior, o campo, leve e arenoso, ainda se encontrava um
pouco molhado, o que permitia a nítida visão da planta das pegadas. A nitidez
era tão perfeita que se viam perfeitamente todos os pormenores do sapato, bem
como toda a sua planta. Os passos apresentavam pouco menos de três pés de
comprimento e iam desde o sítio do salto que o assassino efectuara
da varanda até a uma estrada asfaltada, numa extensão de mais ou menos cento
e cinquenta metros. A parte dianteira, bem como o calcanhar, ou parte
traseira, da pegada apresentava sinais de modo a deduzir-se que o calçado era
de «sola de borracha». O assassino
calçaria aquilo a que chamamos «sapatilhas»,
ou «ténis». Depois de tudo
minuciosamente examinado, os três indivíduos voltam à mansão. É nesta viagem
de volta que o inspector repara que Orlando Moura
coxeia... – Como é que isso aconteceu? – Foi há dias que dei uma queda,
quando passeava de cavalo, e magoei-me na rótula. Por umas semanas não
poderei correr e andarei coxeando – respondeu Orlando, dando uma massagem no
seu joelho. Pouco depois, já os dois indivíduos se
encontram em casa, dispostos a terminar o jogo de xadrez inacabado. – Mais umas jogadas e está no papo.
Vai ver o xeque-mate que lhe vou dar. Até vai delirar de inveja!… – Cala-te e joga! O último a rir é o
que ri melhor! Não é, Mateus?! – responde Ribeiro, enquanto retira, com
esfuziante agrado, do tabuleiro, uma torre adversária. – O quê? Ah, e esta?! – replica
Mateus, «comendo» a dama
adversária. Agora é que vai ser! Vai ficar descalço de inveja! – É isso, Mateus! – grita Ribeiro,
levantando-se bruscamente da cadeira. Anda, vamos daí! Vamos verificar se
Orlando Moura tem razão! – Outra vez! Lá se vai novamente o
xeque-mate! Arranjas sempre uma artimanha para te livrares de perderes! Mas
vamos lá, então. Primeiro a obrigação, depois a devoção! Mas espera aí! Foi
ou não o Orlando Moura o assassino? – Espera um momento, que eu já te digo.
Deixa-me ir buscar o meu cachimbo… Eu já não consigo esperar. Nem mais um
segundo! Por isso pergunto aos queridos leitores do nosso «XYZ-Magazine» quem
terá sido o criminoso (o vulto ou o Orlando Moura) e os porquês, com a
reconstrução do crime, da resposta anterior. Se não lhe agradar este tipo de
perguntas, redija um relatório sobre o crime. |
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© DANIEL FALCÃO |
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