Autor

Rogério Neves

 

Data

19 de Abril de 1957

 

Secção

O Gosto do Mistério [5]

 

Competição

Torneio Policiário da Flama

Problema V

 

Publicação

Flama [476]

 

 

 

 

 

 

 

CRIME OU ACIDENTE?

Rogério Neves

 

O inspector Medeiros puxou o telefone mais para si e discou um número. Pouco depois, do outro lado do fio, atendia o seu «velho» amigo. Sá Reis, jovem dado a aventuras e com bastante jeito para seguir uma pista de crime e descobrir o culpado. Já mais de uma vez o «filósofo» Sá Reis, como o inspector o tratava na intimidade, o ajudara a levar a bom fim casos que pareciam destinados a jazer no arquivo.

– Ouve, Sá Reis – começou o inspector. – Recebi agora mesmo a notícia de que o velho banqueiro Nestor Ferraz apareceu morto no seu gabinete de trabalho. Vou seguir imediatamente para lá com os meus homens. Não queres tu ir também?

– Bem sabes, amigo – foi a resposta – que podes contar comigo, sempre que se trate de castigar um criminoso ou ajudar um inocente. A justiça acima de tudo!…

– Sim? Óptimo! Eu passo por aí e levo-te no meu carro.

Quando, o inspector e o amigo, chegaram a casa do banqueiro, veio abrir-lhes a porta um criado de meia idade, que a seguir lhes falou:

– Os senhores são da polícia? Façam o favor de entrar. Que fatalidade havia de acontecer ao meu amo!

– Não tocaram em nada, como recomendei? – perguntou o inspector. – Bom, então guie-nos à sala onde…

O criado abriu uma porta à sua esquerda, e deixou passar o investigador, o amigo Sá Reis, e ainda o pessoal da polícia que entretanto chegara.

Era uma sala escritório, mobilada sòbriamente. Mesmo ao lado da secretária de madeira negra, jazia um corpo de homem, completamente estendido no chão, com os braços paralelos ao corpo e sangrando da nuca, pequenino fio de sangue já meio empastado que se estendia pelo sobrado encerado e quase sem pó. As pernas do cadáver estavam estendidas, tendo o sapato que calçara o pé direito meio descalço e um pouco metido debaixo do tapete.

Ao lado da cabeça estava uma esfera do lançamento de peso, que apresentava urna parte ensanguentada que se adaptava justamente à parte amachucada da nuca. À volta do corpo, nada mais havia que merecesse atenção.

Enquanto o inspector analisava a sala e o seu conteúdo, os técnicos de fotografia e de impressões digitais batiam chapas sobre chapas.

Sá Reis investigava também e, olhando para o braço esquerdo do banqueiro, chamou-lhe a atenção o relógio de pulso que, apesar de ser de ouro, tinha na pulseira uma fiada de diamantes. Baixando-se junto ao corpo do banqueiro, Sá levantou-lhe o braço e verificou que o relógio estava com o vidro partido, tendo só pequenos fragmentos presos ao aro da caixa. O maquinismo estava parada, e, no mostrador amolgado, os ponteiros marcavam precisamente 15 horas e 28 minutos. Deixando cair o braço do cadáver, o «filósofo» foi sentar-se num sofá, à espera que o inspector começasse a interrogar as pessoas da casa.

O inspector Medeiros mandou chamar o criado que dera com o corpo sem vida, o mesmo que abrira a porta à gente da polícia. O homenzinho entrou e, ao ver o corpo do patrão coberto com um lençol, ficou um tanto ou quanto nervoso; mas quando o inspector o mandou sentar, já o homem tinha adquirido todo o domínio sobre si.

– Conte-nos tudo o que julgue ser de interesse para a polícia – disse o investigador.

– Eu nada sei, senhor inspector. – Disse o homem. – Eram 15 horas e 30 minutos, quando vi o sr. banqueiro pela última vez. Ele tinha estado a falar com o sobrinho aqui nesta sala, creio que por causa de uns dinheiros. Quando depois ouvi o menino sair de casa dirigi-me aqui, a perguntar se era preciso alguma coisa, pois eu iria sair para comprar umas conservas, que estavam a fazer falta para a refeição da noite.

«O senhor Nestor disse que de nada precisava e eu dirigi-me à mercearia, para adquirir o necessário. Cheguei lá, seriam 15 horas e 40 minutos. Voltei a casa por volta das 16 horas e 20 minutos, e logo comecei a preparar o chá, que eu vinha servir ao senhor, quando o encontrei, nessa posição. O peso, que fora oferecido ao senhor banqueiro por um campeão qualquer, e que costumava estar sobre a mesa, vi-o eu tal como está agora, caído ao lado da cabeça. Depois, telefonei à polícia e nada mais sei».

– Isto é um caso arrumado – diz o inspector ao amigo. – Foi sem dúvida um acidente. – E continuou, dizendo, com um húmido sorriso de triunfo a arquear-lhe os lábios:

«O senhor Nestor Ferraz passeia pelo gabinete, agitado por qualquer ideia. Sùbitamente, tropeça no tapete e cai, ao lado da secretária, abanando esta. O peso, que é esférico, rebola, com o choque, e vai cair sobre a cabeça do pobre homem, matando-o».

«Também só um banqueiro se lembraria de ter um peso destes, sobre a secretária».

E, dirigindo-se ao criado, o inspector continuou:

– O senhor pode sair! Vá tomar qualquer coisa que o reconforte.

– Não sai, não senhor – observou Sá Reis, levantando-se. – Não vês, Medeiros, que Nestor Ferraz não morreu aqui, nesta sala, por acidente!?… O banqueiro foi assassinado, e este homem tem estado a mentir!…

 

PERGUNTA-SE

Que pormenores levaram Sá Reis a concluir que o criado mentira?

E porque afirmou que o banqueiro não fora assassinado naquela sala?

 

SOLUÇÃO (em breve)

© DANIEL FALCÃO