Autor Data 12 de Setembro de 1959 Secção Gabinete do Inspector
Varatojo [61] Competição Torneio Scotland Yard 14º Problema Publicação Diário Ilustrado |
O CASO DO PONTO “C” A. Varatojo Crimes
ligados a gente de teatro, traziam sempre complicações e publicidade e, o
inspector Varatojo sabia que, nem as complicações nem a propaganda eram bons
auxiliares de trabalho da Polícia. No
entanto, ao ser cometido um crime, era assinalado um dos três pontos que unem
um segmento de recta. Um ponto estático, imóvel, do meio que desempenhava, no
caso, o papel de vítima. O
inspector era, como sempre, o ponto «A» que corria por dever de profissão, em
linha recta, para o local do crime. Aí
surgiriam milhares de possibilidades ponteadas, radiantes que conduziam a
outros tantos pontos falsos. O
inspector sabia que só uma delas seria a continuação do segmento em cuja
extremidade o esperava o ponto «C». O
mesmo «C» com que se havia de iniciar a palavra «CRIMINOSO».
Caída
de borco sobre a mesinha do pequeno «toillete», pareceria adormecida se não
fosse a mancha avermelhada a tingir as costas do roupão. O
espelho quebrado era um indício tardio de má sorte. E, daí, se considerarmos
as declarações da artista que estava com ela no camarim, talvez o indício
deixasse de ser tardio para ser… imediato. Joana
Miguel estava ainda transtornada e pálida quando o inspector chegou; uma
crise de nervos parecia prestes a rebentar: –
Estava junto dela quando «isto» aconteceu? Varatojo
preferia, sempre, encetar os interrogatórios com perguntas directas. A
rapariga acenou afirmativamente e o inspector prosseguiu: –
Quer contar como foi? –
Eu vim ao camarim de Batista para lhe pedir quinhentos escudos até ao fim do
mês. Eramos amigas e já não era a primeira vez que me emprestava dinheiro
porque eu pagava-lhe sempre nas datas que prometia. Mandou-me
sentar enquanto se arranjava para entrar em cena. Faltavam cerca de dez
minutos. Eu entrava com ela e já estava pronta. Falávamos acerca de homens e
banalidades quando soou o primeiro tiro a quebrar o espelho e o segundo,
quase de seguida. Pela porta entreaberta atiraram o revólver cá para dentro… –
Viu se a mão estava enluvada? –
Não lhe vi, sequer, a mão. A porta entreabriu-se e o tiro soou de seguida…
Nenhuma de nós, deu por nada! Além disso, tenho uma confissão a fazer-lhe,
sr. Inspector! Julgo que Bonita Batista foi morta por engano!... O
inspector não fez perguntas mas, o franzir das sobrancelhas e a expressão interrogativa
animavam a um esclarecimento. Joana
prosseguiu: –
Eu, devia ser o alvo daqueles dois tiros! Ainda,
desta vez, o inspector Varatojo, não disse nada e, mesmo assim, a artista
continuou: –
Um homem ameaçou matar-me com dois tiros e tentou cumprir a sua promessa.
Deve estar, agora, no meu camarim… Desta
vez a pergunta tinha de ser feita. –
Porque diz isso? –
Deixei-o lá quando vim procurar Bonita. –
Mas, se ele ameaçava matá-la porque lhe consentiu a entrada no camarim? Nunca
julguei que fosse a sério. Pensei sempre, tratar-se de um recurso para me
convencer a prestar-lhe atenção. Gabarolices dessas e de outras tenho ouvido
muitas… O
inspector achou que seria altura de ouvir o homem. Já
pegara no revólver com os devidos cuidados para não borrar as possíveis
impressões digitais, introduzindo-lhe um lápis no cano para o levantar do
chão. Estava,
no entanto, convencido de que o assassino actuara de luvas. –
Não saia daqui, por favor! E,
da porta, perguntou, ainda: –
Como se chama o homem? –
Cristino Costa… Engenheiro Cristino Costa! –
Obrigado! Cá
fora, Varatojo, teve dificuldade em pedir ao empresário que continuasse a
manter em sigilo o crime. Aconselhou-o, mesmo, a dizer aos artistas que
Bonita Batista estava indisposta no camarim. Neste
momento só três pessoas sabiam do crime. O
inspector perguntou pelo camarim de Joana Miguel e entrou sem bater. A
cara do engenheiro exprimiu espanto, surpresa, indignação ou medo? –
Que deseja? –
É o senhor engenheiro Costa? –
Sou!... E o senhor, quem é? –
Inspector Varatojo da Polícia Judiciária! O
homem levantou-se e estendeu a mão. Sem
preâmbulos, Varatojo desfechou: –
É verdade ter ameaçado de morte, a artista Joana Miguel? Agora
sim; era medo… Empalideceu
e quis negar: –
Não… Eu não ameacei… Apenas… –
Neste momento, não me interessam bem as suas ameaças mas, apenas, saber se as
cumpriu: Foi você quem matou Joana Miguel? A
palidez de Cristino Costa acentuou-se: –
Não, senhor Inspector! Não a matei! Juro que não a matei! –
Saiu alguma vez deste camarim depois de ter entrado? –
Não!... Espere… Fui até à porta uma vez mas não cheguei a sair! Aflito,
nitidamente descontrolado, acrescentou ainda: –
Confesso-lhe que ameacei Joana… mas, se alguém a matou… não fui eu! –
Tem arma? –
Tenho um revólver! –
Trá-lo consigo? –
Desapareceu-me há cerca de quinze dias! O
sorriso do inspector era convincente para quem o conhecesse. Puxou
de um bloco, tomou notas e olhou para o «croquis» que traçara, do camarim de
Bonita Batista. Noutra
folha escreveu: Provável
Ponto «C»… Que
nome escreveu o inspector à frente do Ponto «C»? Em
que fundamenta o seu raciocínio? |
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© DANIEL FALCÃO |
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